VERBA HISPANICA XXXI • EDVIN DERVIŠEVIĆ 43 Edvin Dervišević DOI: 10.4312/vh.31.1.43-55 Univerza v Ljubljani Algumas considerações sobre o valor condicional em português europeu e esloveno e os possíveis desafios na tradução Palavras-chave: tempo e modo, valor condicional, construções, português europeu, esloveno Os capítulos iniciais deste estudo levantam a questão do condicional enquanto modo e tempo em português europeu e esloveno. Seguidamente, o estudo chama a atenção para algumas considerações sobre o valor condicional e as construções gramaticais que são utilizadas nas duas línguas para desempenhar este valor. O objetivo do estudo é destacar os contextos e valores do condicional e, por meio de uma análise contrastiva, exemplificar a variedade e a complexidade de construções gramaticais. O contributo será relevante para futuras investigações na área da tradução, uma vez que levanta possíveis questões e desafios que podem surgir entre a passagem de uma língua para outra, tal como na área da análise contrastiva entre as duas línguas no âmbito universitário esloveno. 1 Introdução A atividade da linguagem permite aos falantes exprimirem a sua relação, as suas perspetivas e as posições relativas ao contéudo que produzem. Neste sentido, os falantes ajudam a construir novas possibilidades de interpretação linguística e criar novos mundos ainda desconhecidos. Nos capítulos iniciais deste estudo destacar-se-á a questão do condicional enquanto modo e enquanto tempo em português europeu e em esloveno. Seguidamente, propõe-se fazer algumas considerações no que se refere às Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 43 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 43 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 44 construções gramaticais que são disponibilizadas nas duas línguas para marcar o valor condicional. Note-se que neste estudo só se chamará a atenção para as construções verbais que marcam este valor nas duas línguas sem considerar outros meios linguísticos não verbais como advérbios epistémicos, advérbios adjetivais ou partículas que também podem veicular esses valores. Este estudo pretende sublinhar, ainda, alguns desafios na área da tradução que podem surgir na passagem de uma língua para outra e levantar questões que se considerem pertinentes para um estudo mais aprofundado no futuro. 2 A questão do condicional em português europeu Nas gramáticas da língua portuguesa o condicional é tratado de formas diferentes, às vezes considerado como modo, outras vezes apresentado como tempo. Na Nova Gramática do Português Contemporâneo (2005), o condicional é classificado como futuro do pretérito, um tempo do modo indicativo (Cunha & Cintra, 2005: 391). Na Gramática da Língua Portuguesa (2003), explica-se que o condicional se comporta como tempo quando o ponto de perspetiva temporal é o passado e adquire um valor modal se esse ponto for um tempo futuro (Oliveira, 2003: 158). Na Gramática do Português (2013), o condicional é abordado de várias perspetivas. Preliminarmente destaca-se o seu valor temporal de «futuro do passado» – que ocorre posteriormente ao tempo de uma outra situação também passada, tomada como tempo de referência – passando para as suas ocorrências na oração consequente das construções condicionais com o verbo no imperfeito do conjuntivo, contextos em que o condicional não tem valor temporal. Ocorre assim, também, com verbos de tipo durativo e o tempo de referência introduzido por adjuntos adverbiais. Nessas situações o condicional pode adquirir um valor modal epistémico de incerteza ou de probabilidade não confirmada (Oliveira, 2013: 527). Numa perspetiva diacrónica, Brocardo (2016) aponta para a evolução do condicional a partir de perífrases com o verbo latino habere (ter, possuir), com base no modelo que originou o futuro (do presente), ressaltando o facto de existirem mais hipóteses relativamente ao desenvolvimento do futuro e do condicional. Quanto às funções do condicional nas línguas românicas, destaca- se que o condicional no português europeu contemporâneo manifesta um valor temporal (futuro do passado) e um valor «não temporal», ou seja, modal (Brocardo, 2016: 4). Afonso (2018) reúne e sintetiza os estudos que tratam o condicional e a sua compreensão e classificação entre tempo e modalidade, Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 44 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 44 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • EDVIN DERVIŠEVIĆ 45 um conceito que continua a levantar questões. Muitos linguistas classificam o condicional entre os tempos do indicativo graças à sua morfologia, sendo constituído pelos morfemas de infinitivo e de imperfeito. Por outro lado, o indicativo é tido como o modo do «real», enquanto o conjuntivo representa um modo do «irreal». Dado que, no caso do condicional, não se pode sempre falar de um valor de realidade, considera-se este um modo também. Há quem afirme que o modo indicativo, por ser o modo da asserção, não deixa de ser modal mas é somente o «grau zero» da modalidade. Para Gosselin (2008), não faz sentido falar de tempo sem falar de modalidade. No entanto, autores como Merle (2001), quando descrevem a situação do condicional em francês, chamam a atenção para a construção de uma invariante que possa abranger todos os valores que o condicional veicula. Segundo Oliveira, o condicional permite a variedade de empregos que vão de um uso temporal às ocorrências como marcador de uma possibilidade condicionada, de uma incerteza, de um distanciamento de cortesia (Oliveira, 2001: 407). Neste sentido, para Afonso a questão de o condicional ser um modo ou tempo não está no centro das atenções; muito mais importante para ele é reconhecer a presença de configurações em que esta categoria gramatical surge, tentando decifrar quais as suas significações variadas, estejam elas relacionadas com uma ou mais categorias (Afonso, 2018: 12-25). Junte-se a estas afirmações a perspetiva de Marques que, tal como vários autores acima referidos, sustenta a coexistência de valores temporais e modais no caso do condicional. «Se nalguns casos, [...], a forma verbal está associada a um valor de localização no tempo – indicando posterioridade em relação a um tempo do passado –, noutras construções, como em [...], está associada a um valor modal (do domínio da crença)» (Marques, 2013: 675). Tendo em consideração as várias caracterizações do condicional abordadas, é preciso distinguirmos bem entre as duas categorias – tempo e modalidade. Segundo Comrie (1985), o tempo marca a localização temporal dos acontecimentos num eixo temporal concetualizado, enquanto a modalidade é a categoria através da qual os falantes exprimem o seu posicionamento em relação àquilo que é dito. Em português, os conceitos da modalidade podem ser expressos por meio de muitas formas e construções. De acordo com Oliveira, «alguns tempos gramaticais podem criar situações alternativas associadas ao domínio da possibilidade, como é o caso do imperfeito e do futuro (simples e composto)» (Oliveira, 2013: 627). Neste sentido, é impossível analisarmos a modalidade como uma categoria autónoma. Porém, é imprescindível considerála Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 45 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 45 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 46 em conjunto com as categorias do tempo gramatical e aspetualidade. Acontece que vários tempos gramaticais também podem assumir a função de modo e desempenhar o papel dos valores modais. Segundo Afonso, a mesma forma linguística num determinado contexto em português pode ter múltiplas faces e veicular valores correspondentes a mais do que uma categoria (Afonso, 2018: 12-25). Como o conceito do valor condicional está no centro do interesse do nosso estudo, chamar-se-á a atenção especificamente para esse aspeto. Nos capítulos a seguir, apresentar-se-á a variedade de algumas construções verbais que desempenhem o valor condicional nas duas línguas, em português europeu e em esloveno. 3 A questão do condicional em esloveno Tal como no português europeu, em esloveno existem várias formas de definir o condicional. Contudo, o tempo, a modalidade, os modos e os valores modais em esloveno são definidos, classificados e concebidos de forma bem diferente em relação ao português. Há menos dúvidas quanto à classificação do condicional, sendo este considerado em esloveno como modo. Dentro das noções da gramática eslovena, o modo é uma categoria gramatical cuja função é marcar a relação do locutor perante uma ação ou um estado. A gramática eslovena Slovenska slovnica (Toporišič, 2000) apresenta três modos verbais distintos: modo indicativo (povedni naklon), modo imperativo (velelni naklon) e modo condicional (pogojni naklon). O modo conjuntivo desapareceu e foi substituído pelo condicional, verbos modais e advérbios epistémicos. Enquanto em português vários tempos gramaticais podem assumir o papel do modo, em esloveno o modo condicional representa a única maneira para manifestar o valor condicional a nível de construção verbal. Mesmo assim, é importante não nos deixarmos enganar a pensar que esta representação linguística seja a única forma de exprimir a modalidade em esloveno. Como veremos nos capítulos a seguir, a questão é muito mais complexa. Kunst-Gnamuš (1994) explica que é preciso distinguir entre o modo verbal e o modo sintático, uma vez que a forma verbal não pode nem deve representar o único meio linguístico para exprimir a modalidade (Gnamuš, 1994: 195). Em relação à modalidade, recentemente também foi entendido que, no caso do modo em esloveno, não se trata apenas de formas verbais, mas de uma categoria morfosintática que também utiliza outros meios linguísticos, entre os quais os advérbios epistémicos de vários tipos, advérbios adjetivais, partículas e interjeições (Žele, 2023: 1-17). A autora destaca que, em esloveno, a modalidade não deve ser limitada apenas ao Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 46 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 46 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • EDVIN DERVIŠEVIĆ 47 conceito do modo verbal – deve ter em conta também o aspeto pragmático- comunicativo, representando elementos e indicadores como a entonação da frase, a ênfase, tal como a gesticulação (Žele, 2023: 3). Neste sentido, para exprimir as mesmas ocorrências no caso do valor condicional ou da expressão da condicionalidade nas duas línguas podem ser utilizados meios linguísticos bem distintos. 4 Valor condicional T endo a noção da distinção entre o condicional enquanto tempo e o condicional enquanto modo, passar-se-á a apresentar as construções gramaticais que têm valor condicional nas duas línguas. Os exemplos a seguir servem apenas para ilustrar a heterogeneidade de construções verbais que marcam o valor condicional – ou seja, o valor modal – em ambas as línguas. Como foi referido, as formas do condicional não são as únicas maneiras de exprimir o valor condicional em português europeu. Aliás, a utilização do condicional como tempo para marcar o valor modal está a tornar-se menos frequente no contexto linguístico do português europeu contemporâneo, limitando-se muitas vezes aos contextos de registo formal, pelo menos no que diz respeito à oralidade. Por outro lado, o esloveno dispõe de poucas construções verbais no processo da realização do valor condicional, não tendo em conta outros mecanismos de modalidade não verbais. 5 Construções verbais que marcam o valor condicional em português europeu Neste capítulo pretende-se enfatizar a variedade de construções e formas verbais que, no caso do português europeu, podem marcar o valor condicional e exprimir a condicionalidade em vários níveis. Note-se mais uma vez que o objetivo destes capítulos não é pôr em causa a compreensão do condicional enquanto modo ou tempo, tampouco analisar vários tempos e modos separadamente, destacando o valor modal do condicional apenas como uma das categorias possíveis. O que nos interessa é exatamente o contrário: procurar delimitar quais os contextos a nível de construções verbais que têm o valor semântico do condicional. Em primeiro lugar, como construções mais evidentes para desempenhar o valor condicional sobressaem-se o próprio condicional simples/presente e o condicional composto. É preciso logo esclarecer que o condicional no sentido Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 47 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 47 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 48 do tempo gramatical que marca a posterioridade no passado não está incluído nesta classificação a não ser que desempenhe valores modais, nomeadamente o valor condicional, o que é essencial para o presente estudo. Além do condicional simples e do condicional composto, as duas caracterizações esperadas para marcar o valor condicional, serão apresentados também os paradigmas e as construções que levam a etiqueta do condicional, embora não sejam formas do condicional como tal. Nesse sentido, podem ser identificadas as seguintes ocorrências: 5.1 O condicional simples Como já foi explanado, o condicional simples pode desencadear um valor de tempo ou de modo. Segue um exemplo para ilustrar o valor modal. (1) Ele poderia ir contigo amanhã. (ponto de perspetiva = futuro) 5.2 O condicional composto O condicional composto, além de ser um futuro do pretérito em certos contextos de construções condicionais ou frases adverbiais, pode ser modal. Note-se o exemplo abaixo em que se pode inferir que o evento descrito não foi realizado. (2) Se a Maria tivesse chegado a horas, teríamos ido ao cinema. A forma verbal do condicional simples anotada acima no exemplo (1) poderia ser substituída pela forma verbal do pretérito imperfeito, enquanto a forma verbal do condicional composto no exemplo (2) poderia ser substituída pelo pretérito mais-que-perfeito composto na oralidade do português europeu atual – portanto, as variantes gramaticalmente corretas neste contexto também seriam (1) podia e (2) tínhamos ido. 5.3 Interações do condicional com outros tempos e construções gramaticais 5.3.1. O imperfeito Segundo a Gramática da Língua Portuguesa (2003), o pretérito imperfeito é um tempo gramatical com informação de passado, mas que em muitas construções não apresenta características temporais. Com efeito, por ser um tempo alargado, Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 48 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 48 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • EDVIN DERVIŠEVIĆ 49 pode alterar o tipo de evento, havendo uma sobreposição, parcial ou total, com um tempo do passado, ou ainda uma relação de inclusão. (Oliveira, 2003: 156) Sendo assim, o imperfeito não denota sempre um tempo do passado. No entanto, pode marcar com mais frequência a modalidade, particularmente na oralidade do português europeu atual. Veja-se o exemplo abaixo em que a forma verbal do imperfeito adquire um valor completamente modal (Oliveira, 2001: 408). (3) Agora eu era o herói. A utilização de formas verbais do imperfeito em vez de formas do condicional para desempenhar os valores modais está a tornar-se sempre mais comum no português europeu. 5.3.2. O pretérito mais-que-perfeito composto Tal como o pretérito imperfeito, o pretérito mais-que-perfeito composto, em alguns contextos, também pode exprimir um valor modal, sendo muitas vezes utilizado na oralidade em vez do condicional composto. Note-se mais um exemplo abaixo. (4) Se tivesses estudado, tinhas passado no exame. (=Se tivesses estudado, terias passado no exame.) Enquanto as formas do pretérito imperfeito no sentido de modalidade não têm nada a ver com o passado, as formas do pretérito mais-que-perfeito composto estão relacionadas com ações dentro da dimensão temporal do passado. 5.3.3 Construção perifrástica ir + infinitivo Para além das construções verbais apresentadas, deparamo-nos muitas vezes com a estrutura ir + infinitivo. Esta construção perifrástica, enquanto as formas do verbo ir forem no presente, é geralmente utilizada para marcar um tempo futuro. Por outro lado, se forem utilizadas formas do imperfeito ou condicional, esta perífrase verbal adquire um valor modal. Tal valor pode ser expresso por meio de formas do condicional simples do verbo ir + infinitivo num contexto normalmente mais formal ou através do pretérito imperfeito do verbo ir + infinitivo num contexto menos formal, especificamente na oralidade. Segue um exemplo abaixo. (5) Ele nunca ia fazer isso. Podes ter a certeza! Todas as formas e construções verbais relatadas neste capítulo apresentam apenas uma parte da variedade extensa de construções que, no português Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 49 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 49 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 50 europeu, podem desempenhar o valor condicional e podem estar relacionadas com o conceito da condicionalidade e as condições de várias formas. As orações subordinadas adverbiais aqui não se referem ao caso. 6 Construções verbais que marcam o valor condicional em esloveno Relativamente ao esloveno, o valor condicional é marcado através de apenas uma ou, supostamente, duas construções verbais muito claras que não levam a complexidade das múltiplas construções portuguesas. 6.1 O condicional presente A única forma de exprimir o valor condicional em esloveno a nível verbal é a construção do condicional presente, constituída pelo verbo auxiliar bi + particípio passado do verbo principal. Seguem uns exemplos abaixo. (6) Jutri bi imel več časa. (Amanhã teria mais tempo.) (7) Bilo bi lepo. (Seria bom.) (8) Naredili bi uslugo. (Nós faríamos um favor.) (9) Ona bi vzela s seboj tisto obleko. (Ela levaria consigo aquele vestido.) 1 6.2 O condicional passado Além do condicional presente em esloveno, também existe o condicional passado, cuja utilização pode ser associada à utilização das formas do condicional composto em português em determinados contextos. Contudo, no esloveno atual trata-se de uma forma rigorosamente arcaica que está em desuso e, na maioria das vezes, vem substituída pelo condicional presente. Limita-se apenas às situações e aos contextos linguísticos em que é preciso realçar que a ação já não é realizável e faz parte da dimensão temporal do passado, desempenhando então uma função de distinção semântica, mais do que gramatical. Se houver situações ambíguas em que o tempo da ocorrência de uma determinada ação não fique claro, Slovenska slovnica (Gramática da Língua Eslovena, 2000) destaca a importância da utilização do condicional passado nos contextos da ambiguidade. A construção forma-se a partir do verbo auxiliar bi + particípio passado do verbo ser + particípio passado do verbo principal, como ilustrado nos exemplos abaixo. 1 Os exemplos (6), (7), (8) e (9) foram adicionados pelo autor. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 50 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 50 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • EDVIN DERVIŠEVIĆ 51 (10) Pa bi bil ti šel! (Terias ido tu então!/Tinhas ido tu então!) (11) Če bi bil imel denar, bi ti ga bil posodil. 2 (Se tivesse tido dinheiro, ter-to-ia emprestado. (Se tivesse tido dinheiro, tinha-to emprestado.) = não há mais hipóteses para realizar a ação Porém, note-se que, tal como no caso do português europeu, o valor condicional em esloveno pode ser expresso através de tempos gramaticais em orações subordinadas adverbiais. Contudo, o esloveno só dispõe de três representações gramaticais dentro da dimensão temporal que correspondem aos tempos gerais do presente, passado e futuro simples. 7 Desafios na tradução de uma língua para outra A partir das situações linguísticas e exemplos destacados acima, não é difícil constatar uma diversidade inquestionavelmente maior do português europeu em termos de construções e formas verbais que podem ser utilizadas para exprimir o valor condicional em relação ao esloveno. Esta plasticidade de construções portuguesas em comparação com as eslovenas 3 pode ser ilustrada por meio das seguintes tabelas com as formas verbais dos verbos fazer (A) e ser (B). (A) Situações linguísticas Português europeu (PE) Esloveno construídas com valor de presente e de futuro (1) Eu faria este favor. (2) Não sei se iria fazer este favor. (3) Tu fazias este favor para mim? (4) Ias fazer este favor para mim? (5) Se eu fizesse este favor para ti... (6) Se eu fizer este favor para ti... (1) Jaz bi naredil to uslugo. (2) Ne vem, če bi naredil to uslugo. (3) Ali bi mi naredil to uslugo? (4) Ali bi mi naredil to uslugo? (5) Če bi naredil to uslugo zate… (6) Če naredim/bom naredil* to uslugo zate... 2 Os exemplos (10) e (11) foram adicionados pelo autor. 3 Veja-se quanto a esta questão também o capítulo Os paradigmas verbais em esloveno em contraste com português europeu (Muller 2013: 83-100) em: Markič, Nunes Correia: Descrições e contrastes. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 51 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 51 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 52 Situações linguísticas Português europeu (PE) Esloveno construídas com valor de passado (1) Eu teria feito este favor para ti se tivesse chegado a tempo. (2) Eu tinha feito este favor para ti se tivesse chegado a tempo. (3) Se eu tivesse feito este favor, agora ficarias contente. (1) Jaz bi ti (bil*) naredil to uslugo, če bi prišel pravočasno. (2) Jaz bi ti (bil*) naredil to uslugo, če bi prišel pravočasno. (3) Če bi (bil*) naredil to uslugo, bi bil ti zdaj zadovoljen. (B) Situações linguísticas Português europeu (PE) Esloveno construídas com valor de presente e de futuro, situações realizáveis (1) Seria bom se me dissesses a verdade. (2) Era bom se me dissesses a verdade. (1) Bilo bi dobro, če mi poveš resnico. (2) Bilo bi dobro, če mi poveš resnico. construídas com valor de passado, situações irrealizáveis (1) Teria sido bom se me tivesses dito a verdade. (2) Tinha sido bom se me tivesses dito a verdade. (1) Bilo bi dobro, če bi mi povedal resnico. (2) Bilo bi dobro, če bi mi povedal resnico. Neste sentido, seria conveniente levantarmos questões relativas à tradução desse tipo de construções do português para o esloveno e vice-versa. É possível garantir e conservar o mesmo grau de valor condicional na passagem de uma língua para outra? Será que a variedade de construções que no português europeu marcam o valor condicional pode ser substituída por outros meios linguísticos em esloveno que não sejam verbais, tal como advérbios epistémicos e adjetivais? 8 Algumas conclusões provisórias Como podemos ver, o português europeu dispõe de muitas construções gramaticais e as respetivas formas verbais para marcar o conceito da condicionalidade, enquanto em esloveno, a nível de construção verbal, existe apenas uma hipótese de o fazer, através da construção bi + particípio passado do verbo, ou supostamente duas, visto que em raros contextos mais arcaicos também é aceitável a utilização do condicional passado por meio da construção verbo Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 52 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 52 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • EDVIN DERVIŠEVIĆ 53 auxiliar bi + particípio passado do verbo ser + particípio passado do verbo principal. Mesmo assim, é impossível afirmar que o esloveno tenha uma variedade modal menor ou que disponha de menos meios linguísticos para marcar o valor condicional em contraste com o português europeu. Numa língua, existem meios linguísticos não verbais, como mecanismos pragmáticos e até extralinguísticos que, substituindo a abundância predicativa, podem marcar os mesmos valores noutra língua. A extensão e a complexidade do tempo e modo gramatical nas línguas românicas é indubitável e faz com que às vezes fiquemos com a impressão de que outras línguas – como o esloveno, uma língua eslava – não conseguem veicular os mesmos valores de forma tão variada e pormenorizada. Porém, de vez em quando esquece-se que a realidade linguística vai para além das ocorrências verbais e pode tomar cargo de outras funções morfosintáticas, desempenhando distintos valores de forma equivalentemente pertinente e variada. Neste ponto, é preciso acrescentar que as construções acima apresentadas, que marcam o valor condicional, são apenas algumas das possíveis formas e hipóteses de exprimir o conceito da condicionalidade nas duas línguas. É desejável que este tema venha a ser elaborado e desenvolvido num próximo estudo e que este seja apenas uma introdução na investigação desta área linguística. Bibliografia Afonso, A. C. G. (2018): O Condicional/Futuro do Pretérito, entre tempo e modalidade. Dissertação de Mestrado em Linguística. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa. Brocardo, M. T., Barros, A. L. (2016): Estudos sobre o verbo em português: valores, marcas e construções. João Pessoa: Ideia. Comrie, B. (1985): Tense. Cambridge: Cambridge University Press. Cunha, C., Cintra, L. (2005): Nova Gramática do Português Contemporâneo. Lisboa: Edições João Sá da Costa. Gosselin, L. (2008): «De la distinction entre la dimension temporelle de la modalité et la dimension modale de la temporalité» Em: Cahiers de praxématique (47). Montpellier: Pulm, 21-52. Kunst-Gnamuš Kunst-Gnamuš, O. (1994): Performativni glagoli v opisni slovnici slovenskega jezika. Jezik in slovstvo, 189-198. Marques, R. (2013): «Modo». Em: Eduardo Buzaglo Paiva Raposo et al.: Gramática do português. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 673-693. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 53 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 53 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 54 Merle, J. M. (2001): «Le conditionel: temps ou mode» Em: Étude du conditionnel français et de ses traductions en englais. Linguistique contrastive et traduction (n° spécial), 10-23. Muller, B. (2013): «Os paradigmas verbais em esloveno em contraste com português europeu». Em: Jasmina Markič, Clara Nunes Correia: Descrições e contrastes. Tópicos de gramática portuguesa com exemplos contrastivos eslovenos. Ljubljana: Znanstvena založba FF UL. Oliveira, F. (2003): «Os tempos gramaticais». Em: M. Helena Mateus et al.: Gramática da Língua Portuguesa (7.ª ed.). Lisboa: Edições Caminho, 153-166. Oliveira, F. (2013): «Tempo verbal». Em: Eduardo Buzaglo Paiva Raposo et al.: Gramática do português. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 509-553. Oliveira, F., Mendes, A. (2013): «Modalidade». Em:Eduardo Buzaglo Paiva Raposo et al.: Gramática do português. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 623-669. Oliveira, T. (2001): «O futuro e o condicional como marcadores de mediativo». Em: Actas do XVI Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística, 403-414. T oporišič, J. (1992): Enciklopedija slovenskega jezika. Ljubljana: Cankarjeva založba. Toporišič, J. (2000): Slovenska slovnica. Maribor: Založba Obzorja. Žele, A. (2012): Pomensko-skladenjske lastnosti slovenskega glagola. Ljubljana: ZRC SAZU. Žele, A. (2023): Naklon kot morfoskladenjska kategorija v slovenščini. Jezik in slovstvo, 68 (1), 35 –51. Considerations regarding the conditional value in European Portuguese and Slovenian with possible challenges in the area of translation Keywords: tense and mode, conditional value, constructions, European Portuguese, Slovenian The initial chapters of the study emphasize the issue of the conditional as a mode and tense in European Portuguese (EP) and Slovenian. Furthermore, the study reveals some considerations regarding the conditional value and grammatical constructions that are used in the two languages to fulfil this modal value. The study aims to present the contexts and values of the conditional and to exemplify the variety and complexity of grammatical constructions Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 54 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 54 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • EDVIN DERVIŠEVIĆ 55 through a contrastive analysis. This contribution can also be relevant for future research in the area of translation, as it raises possible questions and challenges that may arise during the translation from one language to another. Further research that conducts a contrastive analysis between European Portuguese and Slovenian would be of great importance for the promotion of this fresh field of studies in the Slovenian academic environment. Nekaj premislekov o pogojni vrednosti v evropski portugalščini in slovenščini ter možni prevajalski izzivi Ključne besede: čas in naklon, pogojna vrednost, konstrukcije, evropska portugalščina, slovenščina Uvodna poglavja pričujočega prispevka obravnavajo pogojnik kot naklon in čas v evropski portugalščini in slovenščini. V nadaljevanju je izpostavljenih nekaj premislekov o pogojni vrednosti in slovničnih konstrukcijah, ki se v obeh jezikih uporabljajo za označevanje pogojnosti. Cilj študije je opozoriti na posamezne kontekste in vrednosti pogojnika ter s kontrastivno analizo ponazoriti raznolikost in kompleksnost nekaterih slovničnih konstrukcij. Prispevek ima lahko pomembno vlogo v okviru bodočega raziskovanja na področju prevodoslovja, saj odpira vprašanja in izzive, ki se lahko pojavijo ob prehajanju iz enega jezika v drugega, pa tudi na področju kontrastivne analize med jezikoma v slovenskem akademskem prostoru. Edvin Dervišević Edvin Dervišević é leitor de língua portuguesa na Faculdade de Letras da Universidade de Liubliana, onde também é doutorando em Linguística. As principais áreas de interesse dele são a fonologia e a morfologia do português, particularmente em contraste com a língua eslovena. Também é tradutor e professor de italiano e esloveno. Endereço Univerza v Ljubljani Filozofska fakulteta Oddelek za romanske jezike in književnosti Aškerčeva 2 1000 Ljubljana Slovenija Correio eletrónico: edvin.dervisevic@ff.uni-lj.si Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 55 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 55 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22