VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 25 Mafalda Sofia Borges Soares DOI: 10.4312/vh.31.1.25-41 Sorbonne Université (Paris) / Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa As feições do feminino em português e em francês: análise da receção e da tradução francesas d’A Sibila de Agustina Bessa-Luís Palavras-chave: Agustina-Bessa Luís, A Sibila, tradução, francês, português Este artigo tem como principal objetivo compreender uma das facetas da receção d’A Sibila em França através de uma comparação do original português e da respetiva tradução francesa. Tratar-se-á, mais precisamente, de entender de que modo o feminino é retratado nas duas línguas em análise. Para levar a cabo a nossa investigação, selecionaremos alguns excertos do romance agustiniano nos quais a protagonista Quina é descrita física e/ou psicologicamente, avaliando de que maneira(s) o francês transportou para a sua própria realidade a caracterização daquela personagem. Recorde-se que os idiomas são portadores de sentidos e traumas históricos, e a língua francesa não sofreu, no século XX, o cerceamento a que esteve sujeito o português na sua variante europeia durante a ditadura salazarista – período em que Agustina escreveu esta sua obra-prima. Para além disso, a língua francesa, extremamente atenta a determinadas lutas sociais e veículo de múltiplas reivindicações, assistira já à publicação do livro Le Deuxième Sexe de Beauvoir (1949) quando o romance agustiniano foi dado a conhecer em Portugal (1954). Atentaremos, portanto, ao longo do nosso trabalho, às peculiaridades linguísticas e culturais dos dois idiomas, avaliando os significados explícitos e implícitos que neles são veiculados no que concerne à representação do feminino. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 25 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 25 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 26 1 Introdução Agustina Bessa-Luís é tida por uma das figuras mais fecundas do século XX português, atendendo à vasta obra que deixou. Pressente-se, na sua prosa, o bulício de um espírito empenhado em descortinar a realidade, com uma veemência que prospera a cada curvar de vírgula. Generalizada é também a ideia de que os livros de Agustina amiúde se focalizam na caracterização de personagens femininas. Por intermédio de uma voz que alcança os recessos da intimidade humana, a autora oferece ao leitor um vivo retrato de lutas a que certas protagonistas se entregam, refletindo sobre o meio e as condicionantes que dele procedem (Alves, 2017: 11). Ora, este artigo visa a compreender de que modo a expressão do feminino n’A Sibila foi transposta para a língua francesa. Tratar-se-á de entender como podem o português e o francês comunicar em âmbito literário e a que transformações estará o original sujeito a fim de conseguir entrar numa realidade que a priori não lhe pertence. Para levarmos a bom porto este propósito, começaremos por descrever, muito brevemente, os cenários histórico-culturais de Portugal e França em meados do século XX. Esta introdução permitir-nos-á esboçar o perfil dessas sociedades e perceber em que convulsões cada qual estava envolta em dada altura do tempo. Continuaremos o nosso percurso relembrando alguns contributos académicos concernentes à questão do feminino em Bessa- Luís, não deixando de fazer apelo ao Dicionário Imperfeito com o intuito de perscrutar a própria noção da autora sobre a questão; aludiremos, de seguida, a dados relativos à receção da obra de Agustina em França. Depois destas considerações de natureza teórica, dedicar-nos-emos à parte mais prática, aplicando-nos na comparação entre o original e a respetiva tradução. As passagens selecionadas reportar-se-ão a descrições de pendor físico e/ou psicológico de Quina, as quais nos darão a possibilidade de reiterar algumas reflexões sobre o feminino agustiniano. 2 Contexto histórico em Portugal 1 No ano de 1954, Portugal encontrava-se em pleno regime ditatorial, tendo o Estado Novo sido consagrado em 1933, após aprovação por plebiscito de uma nova constituição. O país assistia à acumulação de funções na figura do Presidente do Conselho (Salazar), à criação da Polícia de Vigilância e de 1 As informações históricas aqui veiculadas baseiam-se nos livros Histoire du Portugal, de Jean- François Labourdette (pp. 569-610), e Histoire du Portugal, de Albert-Alain Bourdon (pp. 163-172). Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 26 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 26 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 27 Defesa do Estado, à proibição de outros partidos para além da União Nacional. Propagava-se, de igual maneira, uma mística aclamando «Deus, Pátria, Família» como valores essenciais da educação nacional e colocava-se a tónica na vocação civilizadora do povo português em territórios ultramarinos, com o escopo de se justificar uma política colonial. Ora, com o término da Segunda Guerra (1939-1945), a ordem mundial sofreu alterações significativas: a Europa, assolada pelas consequências dos confrontos armados e em vias de perder as suas colónias, cedeu o lugar de potência a dois blocos emergentes, os Estados Unidos e a URSS. O regime salazarista, notoriamente retrógrado em relação aos ventos de progresso que desembocariam num período de descolonizações, começava a acusar os primeiros sinais de declínio. A Sibila é, aliás, indício de um modelo político e de um imaginário coletivo em decadência, dado que o romance propõe uma subversão dos papéis sociais atribuídos a homens e mulheres. O mundo de Agustina – aquele em que escreveu – encontrava- se em contínua tensão entre o progresso – vindo dos rumos da História – e a tradição – um desejo de conservar os paradigmas do passado. Assim o é o universo ficcional d’A Sibila: uma esfera em que um novo matriarcado vem substituir o convencional patriarcado, contrariando a célebre imagem de propaganda intitulada «A Lição de Salazar» em que um homem entra em casa do trabalho dos campos, ao passo que a mulher se atém às lides domésticas e ao cuidado dos filhos. Agustina erige uma outra lógica de distribuição das tarefas, escapando ao crivo da censura: no seu romance, os homens, por demais voláteis, ausentam-se das responsabilidades que lhes foram incumbidas, pelo que as mulheres assumem encargos relacionados com o cultivo e a gestão patrimonial, movendo-se doravante entre o interior e o exterior da casa 2 . 3 Contexto histórico em França O ano de 1954 é decisivo para França, uma vez que marcou não apenas o final da Guerra da Indochina mas também o início da Guerra na Argélia. Esta guerra foi, sobretudo, ocasião de apelo a uma revolta perante o status quo, e a cultura letrada tornou-se zona de reivindicações e de perceção do potencial transformador das letras face ao espaço circundante. A noção de littérature engagée (uma literatura comprometida com os combates do seu tempo) – detalhada por Jean-Paul Sartre no seu livro Qu’est-ce que la littérature? – era já aplicada pelos pensadores franceses nos anos 1950, reconhecendo-se à escrita uma capacidade não negligenciável para despertar as consciências e incitar a 2 Cf. Malpique, 2019: 84. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 27 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 27 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 28 tomadas de posição. Importa ainda salientar que 1954 é o ano de atribuição do Prix Goncourt a Simone de Beauvoir pela sua obra Les Mandarins, a qual coloca em cena personagens representativas de intelectuais de esquerda vivendo no pós-Segunda Guerra Mundial e procurando dar um sentido à época em que se encontram 3 . Esta atribuição não deixa, a nosso ver, de ecoar com as datas de 1953 e 1954, anos em que A Sibila ganhou dois prémios literários. Em ambos os casos, uma voz feminina viu recompensada a sua ficção como meio de reflexão pertinente sobre a realidade que a cingia e como proposta, crítica e verosímil, de um mundo suscetível de assumir feições diferentes 4 . 4 Abordagens do feminino O feminino é leitmotiv recorrente – ainda que longe de ser o único – na prosa agustiniana. Ora, antes de nos lançarmos na comparação de excertos d’A Sibila, gostaríamos de preparar o leitor para a sua interpretação, iniciando-o a uma certa conceção do feminino passível de ser identificada no romance em análise. Sustenta a autora, no seu Dicionário Imperfeito, a propósito da maneira como a mulher apr(e)ende o mundo: Diz-se que pensar e sentir são a mesma coisa para a mulher. Mas o que acontece é que são simultâneos, clarificados por uma espécie de vertigem de realidade, póstuma, ao acontecimento. Quando algo acontece, a sua realidade já foi imposta à mulher. O homem confina-se na firmeza do julgamento, porque a realidade é algo que ele adquire, e não algo que tem existência estranha ao homem. Para a mulher, a realidade é criação paralela que lhe sugere uma ideia geral da criação (Bessa-Luís, 2008: 191). A escritora descreve um estado místico, associando-o ao ato de conhecimento feminino 5 . O facto de se aperceber das coisas – e de as perceber sem por isso as pensar de maneira firme – é o que permite à mulher conhecer o que a rodeia. Os sentidos surgem, não apenas como recetores de sensações físicas, mas sobretudo como vias de acesso para uma forma de comunhão com o mundo. Experiencia-se a realidade através dos cinco sentidos e adquire-se, por essa via, uma impressão: algo que marca o sujeito e que nele imprime uma sensibilidade. Equivale isto a dizer que o conhecimento feminino 3 A condição feminina passou a ser um dos temas debatidos na sociedade francesa, sobretudo a partir do lançamento, em 1949, da obra Le Deuxième Sexe, de Simone de Beauvoir. 4 Cf. Schmidt, 1997: 54. 5 Sobre o misticismo em Bessa-Luís, leia-se Dal Farra, M. L. (2014): A mística em Agustina Bessa-Luís e Clarice Lispector. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 28 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 28 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 29 se dá como um acontecimento que se apresenta numa especificidade que lhe é própria. É-nos, assim, possível afirmar que Agustina concebe a mulher como recetora, e não tanto como produtora, de determinados saberes; ela é testemunha de uma realidade cuja presença se manifesta sem precisar de ser moldada. Há ainda outro aspeto que singulariza o conhecimento da mulher agustiniana: a intensidade sensorial, comparada a uma vertigem; como se a mulher tivesse de sair de um mundo dado por adquirido, cuja existência é linear e regulamentada, para melhor o entender – vivenciando um tipo de desequilíbrio que não é perda, mas sim aprofundamento de uma consciência que se lhe torna sui generis. Nas abordagens académicas consultadas, a transgressão é característica recorrentemente atribuída à sibila – figura ligada ao oculto, ao irracional, ao inexplicável 6 . Essa transgressão correlaciona-se em Agustina com uma ideia de emancipação relativamente a um jugo e de aquisição de certos direitos outrora vedados (Lentina, 2012: 300-301). O verbo “transgredir” pressupõe, aliás, uma deslocação e a superação de certos limites. Ora, o que a prosa agustiniana faz é colocar as mulheres da casa da Vessada em movimento, possibilitando-lhes ser senhoras da integralidade do seu espaço. Isto implica o preenchimento de lugares deixados devolutos pela gente masculina. É de notar que a transgressão não assume, neste livro, uma vontade de reivindicação de um estatuto igualitário entre homem e mulher, decorrendo antes de uma necessidade: perante a falta de homens, cujo carácter fugidio os afasta da gestão das propriedades, as mulheres tomam as rédeas, vendo-se obrigadas – pelas circunstâncias, e não pela emergência de um discernimento sobre o seu modo de existir – a repensar a sua relação com a casa, com a terra e consigo mesmas. Pode inclusive alegar-se que são os próprios homens que incitam a uma desconstrução – e a uma consequente reinvenção – do feminino nos seus moldes mais tradicionais. A transgressão da qual Quina é o expoente máximo está também associada ao mover-se da protagonista no seu espaço interior, dentro do qual contacta com uma capacidade para (pres)sentir as coisas. Estamos diante de uma sabedoria pertencente a tempos imemoriais, que tende a cair em esquecimento, mas que, para Quina, equivale a uma profunda conquista de si – conquista que não passa por um conhecimento in totum, que visa a tudo abarcar e compreender, mas, sim, por uma entrega a estados que não se deixam cingir por lógicas alheias (Dal Farra, 2014: 74). 6 Catherine Dumas alude à contradição (ao poder de ir contra uma lógica instituída, de conceber caminhos outros para o pensamento e para o sentimento) como especificidade das personagens femininas em Bessa-Luís. Cf. Dumas, 2022: 14. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 29 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 29 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 30 Curioso é o facto de Eduardo Lourenço, citado por Alda Lentina, se ter reportado à literatura francesa a fim de ilustrar uma tendência estética expressa em Bessa-Luís, atestando da capacidade que as artes portuguesas apresentam para dialogar com outras realidades suas contemporâneas (Lentina, 2018: 160). À semelhança do que ocorria no âmbito das Letras em França, também no Portugal romanceado por Agustina as mulheres deixavam de ser puro objeto de observação e interrogação, descrito sob o ponto de vista daqueles que para elas olhavam. Aquelas mulheres abandonavam o espectro da essência feminina, o qual esquece a particularidade das vivências de cada qual 7 , e contrariavam o retiro como propensão natural da sua índole. 5 Receção em França Pese embora o facto de A Sibila ter sido publicada nos anos 1950 em Portugal, a sua primeira tradução para o francês data de 1982, tendo sido assegurada por Françoise Debecker-Bardin, inicialmente com o cunho das Éditions Gallimard; já em 2005, as Éditions Métaillé lançaram uma reedição dessa tradução (sobre a qual nos basearemos). Se excluirmos as edições de La Sybille, podem tão-só contar-se 13 livros de Agustina traduzidos em França, o que constitui uma quantidade muito pouco representativa da extensão da sua obra. É, para além do mais, desconcertante a ínfima quantidade de trabalhos académicos tendo como objeto de estudo principal (criações de) Bessa-Luís 8 . Em França, contam-se tão-só três teses de doutoramento registadas; quanto a artigos universitários publicados em revistas francesas, destacam-se quatro principais. No próprio site da Bibliothèque Nationale de France, que dedicou, em 2022, uma curta entrada ao centenário do nascimento de José Saramago e de Agustina Bessa-Luís, se reconhece que a escritora está ainda pouco traduzida e que Saramago é mais conhecido do público leitor francês. Ora, perante estes 7 Cf. Beauvoir, 2014: 524. 8 Os artigos, livros e teses a que nos referimos encontram-se listados na parte bibliográfica deste trabalho. Chamamos a atenção do leitor para o facto de as nossas pesquisas se aterem à rede de bibliotecas da Sorbonne e à da Bibliothèque Nationale de France (as quais nos pareceram ser os instrumentos de maior difusão de conteúdo académico acessível a alunos, professores e investigadores). É possível que outro material dedicado a Agustina exista, ainda que o seu acesso seja mais limitado. Ademais, deixámos propositadamente de lado trabalhos que mencionavam Agustina quando a análise dos seus livros não era o motivo central do estudo; evitámos aludir a trabalhos relativos à adaptação de textos agustinianos para o cinema, por exemplo, nos quais se dava muito mais enfoque ao trabalho do realizador Manoel de Oliveira. Neste contexto, dedicamo-nos tão-só a entender como pode Agustina, por si só, interessar o público que vive em França. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 30 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 30 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 31 dados, assevera-se-nos proveitoso declarar que escritores como Bessa-Luís exibem, não apenas génio, mas igualmente assuntos passíveis de estabelecerem um diálogo profícuo entre culturas. Atrevemo-nos, por isso, a defender que o falta a Portugal não é engenho literário, mas sim presença de estratégias sólidas de internacionalização das suas artes – as quais apresentam, pelos temas e pela perícia com que estes são abordados, motivos suficientes para serem apreciadas fora do seu contexto de produção nacional. 6 Análise da tradução francesa Antes de examinarmos a tradução francesa, impera advertir o leitor de que esta é, grosso modo, fiel ao original. Françoise Debecker-Bardin, para além da coragem de traduzir uma obra repleta de regionalismos e de referências histórico-geográficas muito precisas, soube fazê-lo respeitando as características gerais do texto. As ressalvas que aqui serão apontadas concernem a detalhes relacionados com a interpretação do feminino e com a imagem que Agustina dele fornece, não constituindo críticas acerbas visando a colocar em causa o trabalho feito pela tradutora. A tarefa do tradutor é, como se sabe, construção de uma eterna torre de Babel, havendo sempre possibilidade de refletir sobre ela tendo em conta os usos de cada época. Debrucemo-nos, então, sobre o primeiro excerto escolhido, atinente à descrição de uma certa tendência psicológica de Quina: Ela, que até ali julgara prescindir dos respeitos, das atenções, do amor, que apenas fora uma rapariguinha activa na obediência, apagada mesmo por ser demasiado exacta, por temer salientar-se, incorrer em faltas, suscitar uma crítica, um reparo nem que fosse de louvor, compreendeu como a sua natureza vibrava com o afecto, a admiração, e como se expandia em energias apaixonadas, até derramar em volta uma influência de simpatia, de força, de irrecusável imperativo. Ela compreendeu isto, não pela razão, mas pelo sentimento (Bessa-Luís, 2017: 52). Elle qui jusque-là avait cru renoncer à la considération, à l’attention et à l’amour, elle qui avait été simplement une petite fille active dans l’obéissance, effacée à force d’être docile et de craindre de se faire remarquer, d’être prise en défaut, de s’attirer une critique ou même un compliment, comprit soudain combien sa nature vibrait sous l’affection et l’admiration, comme elle se répandait en énergies passionnées, jusqu’à diffuser autour d’elle un courant de sympathie, de force et d’autorité irrécusable. Elle comprit cela, non avec sa raison, mais par intuition (Bessa-Luís, 2005: 50). Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 31 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 31 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 32 Duas traduções retêm a nossa atenção: “exata” e “sentimento”. O adjetivo “exata” denota “precisão”, “rigor” ou até “ausência de erro”, ao passo que o adjetivo docile se refere a uma disposição para se deixar influenciar por outrem. Ora, o que a voz narrativa aqui pretende é fazer sobressair o facto de Quina – outrora empenhada em adotar uma conduta exemplar, apagando qualquer marca passível de a distinguir do meio em que se inseria – ter começado a perceber que a sua presença exercia uma dada influência sobre o que a rodeava. Trata-se menos de realçar a tendência manobrável do seu comportamento do que reforçar o seu empenho em não destoar do ambiente em seu redor. Perde- se, na tradução francesa, a noção de que a passividade de Quina lhe advinha da sua tentativa de corresponder a expectativas. Essa responsabilidade no que tange à própria condição é, a nosso ver, um ponto crucial, pelo que o adjetivo docile nos parece atenuar essa responsabilização. Exacte em francês poderia servir, sem quaisquer riscos de tradução literal. A palavra “sentimento” é, por sua vez, plurívoca: esta reporta-se tanto a um estado de afeição quanto a uma sensibilidade, a um envolvimento e até a uma ligação. Ora, a polissemia do vocábulo “sentimento” permite congregar a pluralidade do saber feminino: este associa as informações provindas dos sentidos a um estado de entrega amorosa. Esta união do sensório e do emocional, que desemboca numa sensação vertiginosa, não é transmitida na intuition – a qual coloca a tónica na índole direta de uma dada gnose. Enquanto o “sentimento” pode ser perturbador, resultando de uma mistura de sinestesia e de rendição, a intuition é caminho nítido em direção a uma verdade. Propomos, portanto, a tradução francesa sentiment, sem que isso nos faça cair na armadilha dos faux amis. Muito curiosamente, a tradutora optará, uma vez mais, pelo termo intuition numa outra passagem da obra, desta feita para traduzir o termo “sentido” a propósito do modus cognoscendi (e, por extensão, do modus essendi) de Quina: Mercê dum sentido finíssimo para se embrenhar nos fenómenos da natureza, humana ou simplesmente do meio vital, com os seus elementos, suas causas e efeitos, depressa adquiriu uma sabedoria profunda acerca de todos os ritmos da consciência, do instinto, das forças telúricas que se conjugam no fatalismo da continuidade (Bessa-Luís, 2017: 57). Grâce à une intuition très fine, elle pénétrait profondément les manifestations de la nature humaine ou simplement du milieu vital, ses éléments, ses causes et ses effets, et elle gagna rapidement une connaissance profonde de tous les rythmes de la conscience, de l’instinct, des forces telluriques qui se conjuguent dans le fatalisme de la continuité (Bessa-Luís, 2005: 56). Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 32 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 32 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 33 Ao passo que o “sentido” remete tanto para a dimensão empírica quanto para a formação de um entendimento, a intuition concentra-se no facto de esse entendimento ser inequívoco, relegando para segundo plano o universo das sensações físicas e a desorientação que a sua intensidade pode causar. O vocábulo sens em francês, que mantém as mesmas aceções do que a palavra em português, afigura-se-nos, assim, mais adequado no contexto em análise. Acrescenta a voz narrativa, ainda sobre o modo de ser de Quina: Agiu [Quina] sempre num plano bastante medíocre de vaidade e pura ternura para tudo quanto lhe parecia informemente criado e existindo num estado temporário de imperfeição, ternura esta tão grande quanto o seu desprezo, porque tudo quanto ela amava – todas as criaturas, todas as formas, os mistérios, a própria beleza – lhe parecia longe e diferente do que ela teria desejado (Bessa-Luís, 2017: 57). Elle agit toujours sur un plan assez médiocre de vanité et de pure tendresse pour tout ce qui lui paraissait informe, créé dans un état temporaire d’imperfection, et cette tendresse était aussi grande que son mépris, car tout ce qu’elle aimait – créatures, formes, mystères, et la beauté elle-même – lui semblait décevant et froid à côté de ce qu’elle avait rêvé (Bessa-Luís, 2005: 57). Há dois aspetos a ter em conta na tradução avait rêvé: o tempo e o modo verbais (o plus-que-parfait de l’indicatif) a par do verbo (rêver). Em português, a voz narrativa utiliza o condicional composto (teria desejado), o que significa que se trata de uma ação hipotética que nunca terá lugar. Estamos diante da projeção de um cenário imaginado sem qualquer possibilidade de realização: as coisas que Quina amava eram tão diferentes dos seus próprios desejos que essas se imbuíam da irrealidade de um condicional. Não obstante, a tradutora optou por um tempo do indicativo, modo que confere concretude aos factos narrados. Não é impossível que a adoção do verbo rêver funcione como uma estratégia de compensação relativamente à natureza assertiva do indicativo, mas os verbos “desejar” e “sonhar” têm as suas diferenças. O “desejo” pode relacionar-se não só com um impulso corporal como com uma aspiração, ao passo que o “sonho” se imbui de uma dimensão mais idealista que não admite uma conotação corpórea nem uma necessidade de satisfação. Há algo mais terra-a-terra no desejar agustiniano que se perde no verbo rêver. Propomos, por conseguinte, a tradução aurait désiré. Ainda a propósito da disposição psicológica de Quina sobre as coisas que a rodeiam, concentremo-nos no seguinte parágrafo: Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 33 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 33 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 34 Não sabia ambicionar; sabia impor-se uma exigência de triunfo imediato. Não tinha imaginação para arquitectar, esperar; apenas compreendia o momentâneo, e era isso que ela queria adquirir. Tudo o que não obedece a um plano, dura apenas o tempo de realização; e não tem glória, nem esse cunho das coisas humanas que trazem consigo um alento de superação e de eternidade (Bessa-Luís, 2017: 80). Elle n’était pas capable d’ambition, elle était capable de s’imposer en exigeant un triomphe immédiat. Elle n’avait pas suffisamment d’imagination pour dresser ses plans et attendre ; elle ne comprenait que le triomphe de l’instant, et c’était cela qu’elle voulait obtenir. Or, tout ce qui échappe à un plan dure seulement le temps de la réalisation et ne connaît pas la gloire, ne porte pas le cachet distinctif des réalisations humaines qu’a soulevées un souffle d’idéalisme et d’éternité (Bessa-Luís, 2005: 80). Gostaríamos aqui de analisar a tradução de “sabia” e de “superação”. Em primeiro lugar, acreditamos haver uma nuance entre “saber” e “ter capacidade para”. Um pouco mais atrás nesta passagem do livro, a voz narrativa frisa que coexistem em Quina forças contrárias: uma potencialidade para ser grande e uma mediocridade que a impede de o ser 9 . Ora, o verbo “saber” implica aquisição de competências, relacionando-se com possessão ou acumulação. Por seu turno, a “capacidade” demonstra um elo mais próximo com características inatas ou inclinações intrínsecas. Afigura-se-nos, assim, pertinente afirmar que Quina tinha capacidade para ter ambição – havendo em sua natureza algo latente –, não tendo, porém, aliado a essa sua capacidade um saber (um savoir-faire, um know-how) passível de canalizar aquilo que dentro dela tinha lugar. A tradução ne savait pas aparece-nos, assim, mais fiel ao original. No que tange ao vocábulo idéalisme, este pode remeter para uma negação da realidade do mundo fora da esfera do pensamento humano e para uma predominância dos valores morais em detrimento dos materiais. Cremos que o texto coloca a tónica no próprio ato de ultrapassar, e não tanto no resultado do mesmo. Sublinha-se a importância de a personagem (se) projetar para lá do instante vigente, e não tanto a importância daquilo que Quina deverá projetar (os seus ideais): antes de saber o que se perfila no horizonte, é preciso aprender a olhar nessa direção. Atrevemo-nos, portanto, a sugerir a palavra dépassement, que conserva, não apenas a ideia de “ir para além de” quanto a noção de desenvolvimento pessoal (nomeadamente na sua forma reflexiva, se dépasser). 9 Cf. Bessa-Luís, 2017: 80. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 34 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 34 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 35 No último trecho selecionado, aborda-se o desprezo que Quina sente pelas mulheres – o qual não deve ser interpretado como ódio 10 , mas antes como desconsideração: A verdade era que, toda a vida, ela lutara por superar a sua própria condição, e, conseguindo-o, […] mantinha em relação às outras mulheres uma atitude não desprovida de originalidade. Amadas, servindo os seus senhores, cheias dum mimo doméstico e inconsequente, tornadas abjectas à custa de lhes ser negada a responsabilidade, usando o amor com instinto de ganância, parasitas do homem e não companheiras, Quina sentia por elas um desdém um tanto despeitado e mesmo tímido, pois havia nessa condição de escravas regaladas alguma coisa que a fazia sentir-se frustrada como mulher (Bessa- Luís, 2017: 105-106). La vérité, c’est que toute sa vie elle avait lutté pour surmonter l’obstacle de sa condition et, maintenant qu’elle avait réussi, […] elle adoptait envers les autres femmes une attitude qui n’était pas dépourvue d’originalité. Elles étaient aimées et servaient leur seigneur et maître, toutes pleines d’une perfection domestique et inconséquente, rendues abjectes à force d’être tenues à l’écart des responsabilités, elles se servaient de l’amour en espérant un profit, parasites de l’homme et non ses compagnes, et Quina leur vouait un dédain un peu dépité et même timide, car il y avait dans leur condition d’esclaves satisfaites quelque chose qui lui faisait prendre conscience de ce qu’elle-même avait de frustré en tant que femme (Bessa-Luís, 2005: 107). Atentemos à passagem “ela lutara por superar a sua própria condição”. Na tradução francesa, elide-se o adjetivo “próprio” e acrescenta-se o substantivo “obstáculo”. Ora, o adjetivo vem dar relevo à natureza individual da ação da protagonista. Quina tenciona libertar-se, a si mesma, e não outras mulheres – sublinhando-se a sua visão por demais ancorada no presente, não delineada em projetos mais vastos do que o recinto do seu quotidiano. Em francês, pode eventualmente pensar-se que sa condition diz respeito à condição de Quina enquanto membro de um coletivo mais vasto a que se pode dar o nome de “mulheres”, perdendo-se a dimensão autocentrada da protagonista. Para além disso, a palavra obstacle vem interpretar a dificuldade da empresa – e tingir de certo heroísmo a conduta de Quina –, mas essa valorização encontra-se ausente na versão em português. Parece-nos que a tradução elle avait lutté pour surmonter sa propre condition seria a mais apropriada. 10 Cf. Bessa-Luís, 2017: 105-106. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 35 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 35 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 36 Teceremos ainda um derradeiro comentário a propósito da passagem “alguma coisa que a fazia sentir-se frustrada como mulher”. O verbo “sentir-se” foi traduzido como prendre conscience; todavia, o sentimento e a sensação agustinianos estão mais próximos de um estado inconsciente – em que se verifica uma certa fusão com o que envolve a personagem – do que de um estado em que o sujeito feminino processa ativamente as informações que a si lhe chegam. Ademais, a frase em francês, de propensão explicativa, modifica as informações veiculadas no texto. O original diz que Quina fica desolada perante o comportamento daquelas que deveriam ser suas semelhantes. Noutros termos, há um afastamento face a um grupo ao qual Quina tão-só pertence por via do género, uma vez que esta não deseja reproduzir o modo de vida que lhe está associado. Quina sente-se «frustrada como mulher», não por ser mulher stricto sensu, mas sim por as mulheres que a rodeiam não representarem aquilo que aspira a ser – no fundo, por não ter à sua volta nenhum modelo feminino capaz de a inspirar. A frustração não provém, embora nela possa ecoar, da interioridade – de um pedaço de si que constituiria uma espécie de vergonha para a própria –, mas antes de condutas exteriores. O que desalenta Quina é o facto de as mulheres que se encontram fora de si se revelarem inaptas para espelharem, e fazer sobressair, a mulher que jaz, reclusa, dentro de si. Oferecemos, por isso, como sugestão a frase quelque chose qui la faisait se sentir frustrée en tant que femme. 7 Considerações finais Foi-nos possível observar, ao longo do presente artigo, algumas particularidades do feminino em Agustina e a maneira como certas semânticas foram traduzidas para francês. Vimos, outrossim, que dois países como Portugal e França – cujas reivindicações históricas não coincidem nem no tempo nem no modo – têm grande capacidade para dialogar, não apenas por haver relativa fluidez na transposição de significados de uma língua para a outra, mas ainda por certos leitmotivs patentes na literatura portuguesa conseguirem encontrar, com facilidade, ecos fraternais na literatura francesa. Não obstante estarem ancoradas em contextos distintos – com evoluções, ritmos e tiranias que lhes são próprios –, as duas sociedades têm matéria para se compreenderem mutuamente. Sublinhe-se, no entanto, que o que tornará frutífero o colóquio entre os dois países situar-se-á muito menos nos pontos em que ambos se reconhecem – os quais servirão de motivo de interesse – e muito mais nos pontos em que ambos se estranham – os quais servirão de motivo de questionamento. Necessária Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 36 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 36 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 37 é a curiosidade pela forma como espaços geográficos tão próximos podem, cada qual a seu modo, dar resposta a questões que lhes são comuns. Agustina Bessa-Luís é, porventura, equiparável a Simone de Beauvoir, uma vez se ter debruçado sobre as complexidades da questão feminina. Não o fez, contudo, nem pelos mesmos meios, nem com a mesma linguagem, nem avançando os mesmos argumentos. Ao passo que o debate se fazia em praça pública e o ensaio filosófico se assumia, para Beauvoir, como forma de contestação por excelência, a literatura de Agustina conferia espessura à reflexão na aparente tranquilidade da ficção romanesca. A sociedade portuguesa terá, também ela, criado os seus espaços de palavra livre; seguramente mais sub-reptícios, por certo mais discretos nas suas reivindicações – sem que, no entanto, esse recato tenha retirado às artes qualquer força retórica. Basta ler nas entrelinhas. Bibliografía Beauvoir, S. (1954): Les mandarins. Paris: Éditions Gallimard. Beauvoir, S. (2014): Le deuxième sexe. Tome II. Paris: Éditions Gallimard. Bessa-Luís, A. (2017): A Sibila. Lisboa: Relógio d’Água. Bessa-Luís, A. (2008): Dicionário Imperfeito. Lisboa: Guimarães Editores. Bessa-Luís, A. (2005): La Sibylle. T raduction de F rançoise Debecker-Bar din. P aris: Éditions Métailié. Bourdon, A.-A. (2019): Histoire du Portugal. Paris: Éditions Chandeigne. Christophe C., Laurent J. P. (dirs.) (2016): La vie intellectuelle en France II. De 1914 à nos jours. Paris: Éditions du Seuil. Dal Farra, M. L. (2014): «A mística em Agustina Bessa-Luís e Clarice Lispector», Revista Chilena de Literatura, 88, 63-76: https://www.scielo.cl/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0718-22952014000300004(30–06–2023). Denis, B. (2000): Littérature et engagement [e-book]. Paris: Éditions du Seuil. Dumas, C. (2022): «Agustina Bessa-Luís e as mulheres». Anuário de Literatura, 27, 1-17: https://periodicos.ufsc.br/index.php/literatura/article/view/87246 /51981 (30–06–2023). Labourdette, J.-F. (2008) : Histoire du Portugal. Paris: Éditions Fayard. Lentina, A. M. (2018): «Questions de genre au Portugal: le cas d’Agustina Bessa-Luís». Iberic@l, 13, 155-167: https://iberical.sorbonne-universite. fr/wp-content/uploads/2019/02/Pages-from-Iberic@l-no13-printemps- 2018-Final-11.pdf (30–06–2023). Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 37 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 37 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 38 Malpique, C. (2019): «Amor de perdição em Agustina Bessa-Luís». Revista Portuguesa de Psicanálise, 39 [2], 81–84: https://rppsicanalise.org/index.php/ rpp/article/view/15/15 (30–06–2023). Sartre, J.-P. (1944-1946): Qu’est-ce que la littérature ?Situations, tome II. Paris: Éditions Gallimard. Schmidt, S. P. (1997): «As mulheres narradoras em A Sibila: experiências e memória». Revista de Ciências Humanas, v. 15, n. 21, 53-70: https://periodicos. ufsc.br/index.php/revistacfh/article/view/23354/21031 (30–06–2023). Sitiografia Artigo da Bibliothèque Nationale de France https://www.bnf.fr/fr/actualites /il-y-100-ans-naissance-de-deux-geants-des-lettres-portugaises Catálogo da Bibliothèque Interuniversitaire de la Sorbonne https://www.bis- sorbonne.fr/biu/ Catálogo da Bibliothèque de Sorbonne Université https://www.sorbonne- universite.fr/bu Escritores portugueses traduzidos em França https://ecrivainsportugaisen france.com/ Dicionários e gramáticas consultados Academia das Ciências de Lisboa (2001): Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea. I Volume A-F. Lisboa: Editorial Verbo. Academia das Ciências de Lisboa (2001): Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea. II Volume G-Z. Lisboa: Editorial Verbo. Celso, C., Cintra, L. (2002): Nova Gramática do Português Contemporâneo. Lisboa: Edições João Sá da Costa. Goose, A. (1997): Grevisse le bon usage. Grammaire française. Paris: Éditions Duculot. Artigos académicos sobre Agustina Bessa-Luís publicados em França Dumas, C. (2018): «Du sang et des ailes. La métamorphose chez Graça Morais et Agustina Bessa-Luís», Sigila, 42, 37-51: https://www.cairn.info/revue- sigila-2018-2-page-37.htm (30–06–2023). Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 38 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 38 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 39 Lentina, A. M. (2015): «Agustina Bessa-Luís ou une poétique du féminin». Estudios Románicos, 24, 19–32: https://revistas.um.es/estudiosromanicos/ article/view/245161 (30–06–2023). Lentina, A. M. (2016): «Agustina Bessa-Luís et la « con-fusion des genres ». Iberic@l, 9, 103– 112: https://iberical.sorbonne-universite.fr/wp-content/ uploads/2016/05/Pages-from-Iberic@l-no9-printemps-2016-10.pdf (30–06–2023). Marinho, M. de F. (2010): «À la recherche de l’identité perdue (essai sur la crise d’identité dans le roman portugais contemporain)», Carnets, Première Série, 2, 243-253: https://journals.openedition.org/carnets/5313 (30–06–2023). Livros sobre Agustina Bessa-Luís publicados em França Dumas, C., Levécot, A. (dir.) (2015): Audaces et défigurations. Lectures de la romancière portugaise Agustina Bessa-Luís, Paris: Presses Sorbonne Nouvelle. Teses de doutoramento sobre Agustina publicadas em França Alves, M. do C. (2017): La « vision du monde » sexuée chez Agustina Bessa-Luís. Paris: L ’Harmattan. Dumas, C. (1980): «Mystère et réalité dans l’œuvre d’Agustina Bessa-Luís». Thèse de 3 e cycle Études portugaises. Paris: Université Paris-Sorbonne. Lentina, A. M. (2012): «Agustina Bessa-Luís et l’écriture de l’Histoire». Thèse de doctorat. Paris: Université Paris-Sorbonne. Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 39 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 39 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • O MUNDO LUSÓFONO NAS LÍNGUAS E LITERATURAS ROMÂNICAS 40 Feminine features in Portuguese and French languages: analysis of the French reception and translation of A Sibila by Agustina Bessa-Luís Keywords: Agustina-Bessa Luís, A Sibila, translation, French language, Portuguese language This article aims to understand one of the facets of the reception of A Sibila in France through a comparison of the Portuguese original text and its French translation. More precisely, we shall try to understand how the feminine is portrayed in the two languages under analysis. To carry out our investigation, we will select some excerpts of the Augustinian novel in which the protagonist Quina is described physically and/or psychologically, evaluating in which way(s) the French language has transported the characterization of this fictional figure to its own reality. It should be remembered that languages carry historical meanings and traumas, and the French language did not suffer, in the 20 th century, the restriction to which the European variant of Portuguese was subjected during the Salazar dictatorship – the period in which Agustina wrote this masterpiece. Moreover, the French language, extremely attentive to certain social struggles and a vehicle of multiple claims, had already seen the publication of the book Le Deuxième Sexe de Beauvoir (1949) when A Sibila was made known in Portugal (1954). Therefore, throughout our work we will focus on the linguistic and cultural peculiarities of the two languages, evaluating the explicit and implicit meanings that are conveyed in both of them concerning the representation of the feminine. Predstavljanje ženskega spola v portugalskem in francoskem jeziku. Analiza recepcije francoskega prevoda romana A Sibila Agustine Besse-Luis  Ključne besede: Agustina-Bessa Luís, A Sibila, prevod, francoščina, portugalščina Namen tega članka je razumevanje enega od vidikov recepcije romana A Sibila (Sibila) v Franciji v primerjavi s portugalskim izvirnim besedilom in njegovim francoskim prevodom. Še natančneje – skuša razumeti, kako je v obeh analiziranih jezikih upodobljena junakinja. Za raziskavo bomo izbrali nekaj odlomkov Agustininega romana, ki glavno junakinjo Quin opisujejo Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 40 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 40 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22 VERBA HISPANICA XXXI • MAFALDA SOFIA BORGES SOARES 41 fizično in/ali psihološko, in nato izpeljali oceno, kako je francoski jezik prenesel karakterizacijo te fiktivne figure v svojo realnost. Ne smemo pozabiti, da jeziki nosijo zgodovinske pomene in travme. Pri tem francoski jezik v 20. stoletju ni bil deležen omejitev, ki jih je bila deležna evropska različica portugalščine v času Salazarjeve diktature – v obdobju, ko je Agustina napisala svojo mojstrovino. Obenem je francoska prevajalka izjemno pozorna na družbene boje, jezik je v Franciji nosilec številnih zahtev, kajti država doživi izdajo knjige Drugi spol Simone de Beauvoir (1949), v času, ko si je roman A Sibila pridobil slavo na Portugalskem (1954). Zato se bomo v celotnem besedilu osredotočili na jezikovne in kulturne posebnosti obeh jezikov ter ocenili eksplicitne in implicitne pomene, pa tudi načine, s katerimi v obeh jezikih izražajo predstavljanje ženskega spola. Mafalda Sofia Borges Soares Mafalda Sofia Borges Soares é doutorada em Estudos Portugueses e Românicos (especialidade de Estudos Comparatistas) e mestre em Tradução (francês, inglês, português). É atualmente Attachée Temporaire d'Enseignement et de Recherche na universidade Panthéon-Sorbonne (Paris I), tendo sido leitora de português na Faculté des Lettres de Sorbonne Université (Paris IV) e lecionado disciplinas de tradução e edição na Université Sorbonne Nouvelle (Paris III). Em janeiro de 2019, publicou a primeira tradução para português de Portugal do livro Contre Sainte-Beuve, de Marcel Proust. Os seus domínios de pesquisa concentram-se em literaturas lusófonas e francófonas dos séculos XX e XXI, tendo a sua tese de doutoramento incidido sobre a ideia de literatura em obras de Marcel Proust e Clarice Lispector. Prepara agora um pós-doutoramento em Paris IV sobre o estatuto do narrador em José Saramago e Annie Ernaux. Endereço: 9 rue Laplace 75005 Paris, 78490 Le Tremblay-sur-Mauldre France Correio eletrónico: mafalda.borges.soares@gmail.com Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 41 Verba Hispanica 2023_FINAL.indd 41 16. 01. 2024 14:39:22 16. 01. 2024 14:39:22